Epicuro, a felicidade e os Concursos Públicos

William Douglas

O concurso público é um caminho válido para a felicidade? Epicuro, filósofo nascido na Ilha de Samos (atual Turquia) parece dizer que sim. Alain de Botton informa que Epicuro "acreditava que todos podem achar um jeito de serem felizes. O problema, segundo ele, é que procuramos nos lugares errados. Ele dizia que não devíamos nos sentir culpados por desejar uma vida prazerosa e divertida, e prometia nos mostrar o caminho para ela". Essas ideias acabaram criando uma confusão, já que aqueles que buscam o prazer desmesurado são chamados de "epicuristas", quando, na verdade, o que Epicuro propugnava não deve ser confundido com o hedonismo. Aliás, um dos males da Pós-Modernidade é exatamente uma sociedade focada apenas no prazer e que foge da dor, do compromisso, das responsabilidades.

Sustentar que Epicuro não era hedonista tem base no Dicionário Básico de Filosofia (Japiassú e Marcondes, Jorge Zahar Editor, 1990, p. 82), que menciona uma orientação epicurista preciosa: "(...) Aprender a bem viver é aprender a melhor gerir seus prazeres, afastando aqueles que não são nem naturais nem necessários e fomentando aqueles que se encontram nos limites da natureza (...)". A ausência total de dor ou sofrimento é uma ilusão, eu acrescento. Querer viver sem dor alguma é uma quimera.

Apesar de Epicuro dizer que o prazer era a coisa mais importante da vida, sua casa era simples, seu guarda-roupa não tinha luxos, ele bebia água em vez de vinho, achava o peixe caro demais e satisfazia-se com refeições à base de pão, legumes e azeitonas. Certa vez ele pediu a um amigo: "Mande-me um pouco de queijo, para que eu possa me banquetear de tempos em tempos". Assim vivia o homem que apontava o prazer como finalidade da vida.

O mesmo Alain de Botton informa que na essência da filosofia epicurista há uma ideia simples: nós não sabemos ao certo o que nos faz felizes. Podemos nos sentir atraídos por bens materiais, na crença de que eles nos trarão felicidade. Mas muitas vezes erramos. Nem sempre desejamos aquilo de que precisamos, e não há prova maior disso do que nosso comportamento de consumo.

Epicuro dizia ter descoberto nossas verdadeiras necessidades e, para a sorte dos menos abastados, os ingredientes para a felicidade são bem baratos. Eles eram três: (a) ter amigos; (b) ter liberdade, incluída aí a financeira e (c) refletir sobre a vida.

Não é preciso escrever muito sobre a importância dos amigos. Quanto ao segundo requisito, a ideia de Epicuro era ser auto-suficiente, de modo que a pessoa não tivesse que se curvar a situações opressivas para conseguir se sustentar. Para implementar uma vida de prazer, liberdade e convívio constante, Epicuro e seus amigos se afastaram de Atenas e fundaram uma espécie de comunidade alternativa. "Devemos nos libertar dos grilhões do cotidiano e da política", escreveu Epicuro. E foi exatamente isso que seu grupo fez. Levaram uma vida simples, mas com liberdade. Assim, viveram de modo simples, sem muito dinheiro, mas auto-suficientes e sem depender da opinião alheia ou da política.

Quanto ao terceiro ingrediente, Epicuro acreditava que devíamos ter uma vida bem analisada, reservar tempo para reflexão, para fazer a análise do que nos preocupa. Nossas ansiedades diminuem se nos damos tempo para pensar nelas. Mas, para isso, temos de nos afastar das distrações do mundo material e acharmos o tempo e o local adequados para pensarmos em nossa vida.

Para Epicuro, quem tem amigos, uma vida bem analisada e auto-suficiência não terá problemas para chegar à felicidade, mesmo que tenha problemas com dinheiro, saúde ou de outras naturezas. Epicuro dizia que, tendo dinheiro para as necessidades básicas, você podia logo começar a ser feliz, desde que tivesse os três requisitos. E o grau de felicidade não aumentaria de acordo com o grau de riqueza, ele ficaria estável. Às vezes, o aumento da riqueza até atrapalha. A Bíblia, por exemplo, menciona que o rico se preocupa com a proteção e a manutenção (quando não, com a expansão) das suas riquezas, ao passo que o pobre não tem essas inquietações.

A busca por riquezas e luxo tolda a percepção e desvia as pessoas da felicidade. É comum que esta busca acabe afastando as pessoas da vida simples, dos amigos, da liberdade financeira e, por fim, toma tempo que poderia ser dedicado ao prazer, amigos e reflexão. Não que a riqueza vede a felicidade, ela apenas não é uma garantia disso. Por isso, não devemos gastar toda a nossa energia buscando bens materiais. E então, para seguir adiante, vemos que os concursos públicos podem ser um interessante instrumento para se aproximar da felicidade. Os concursos facilitam em muito a obtenção dos três requisitos listados por Epicuro.

Sobre os vencimentos pagos pelo Estado, alguns são excelentes, ainda mais se levarmos em conta o grau de qualidade de vida possível, e outros nem tanto. Mas de um modo geral, mesmo os mais modestos estão numa faixa razoável, comparada com a média salarial nacional. Executivos e empresários podem ter muito mais dinheiro, mas o grau de estresse, tempo e riscos a que se submetem são exponencialmente mais desgastantes. Além disso, o sistema de trabalho e a clareza do que deve ser feito pelo servidor são melhores do que na iniciativa privada. Por esse motivo, não havendo o interesse em iates e apartamentos em Paris, o serviço público fornece uma boa proposta de equilíbrio entre remuneração, trabalho e qualidade de vida.

Ao lado disso, o tempo que o serviço público proporciona vai permitir que a pessoa escolha entre várias possibilidades, dentre as quais estão o estudo da filosofia, a reflexão, o lazer, a companhia da família ou dos amigos. E por falar em amigos, os cursos preparatórios, a vida de concurseiro, o cotidiano entre os servidores de um órgão e o fato de estarmos servindo ao próximo, tudo isso facilita a criação e desenvolvimento de boas amizades. Ao atender bem o semelhante, estimulamos um novo tipo de contato, uma amizade "genericamente difundida". Tratar aos outros como amigos ou como gostaríamos de ser tratados é algo que se faz presente em todas as filosofias e religiões do mundo. Aqui cabe citar o versículo bíblico de Provérbios 12.20b: "os que trabalham para o bem dos outros encontrarão a felicidade".

Em suma, na velha discussão sobre qual a melhor carreira, não tenho dúvidas de que Epicuro, se estivesse vivo, recomendaria o concurso público como excelente opção para quem quer ter amigos, liberdade financeira e tempo para refletir e viver bem. A melhor escolha não é o concurso ou a iniciativa privada, alerto: isso, só cada um pode dizer. Afinal, como era desde a época de Epicuro e Diógenes, a felicidade continua sendo, se não a melhor, ao menos uma das melhores formas de se verificar o sucesso. Faça suas escolhas, orgulhe-se delas e boa sorte, sempre!

Nota 1: Para quem quiser saber mais sobre Epicuro, sugiro os DVDs da Revista Vida Simples, "Filosofia para o dia-a-dia", série para a TV baseada no livro "As consolações da filosofia", de Alain de Botton.

Nota 2: Para quem tem interesse na aplicação da Bíblia à vida moderna e sua relação com este artigo, há um suplemento bíblico disponível no meu site.

William Douglas é juiz federal, professor universitário, palestrante e autor de mais de 30 obras, dentre elas o best-seller "Como passar em provas e concursos".

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O PCI Concursos em parceria com o site www.williamdouglas.com.br,disponibiliza aqui, vários artigos, textos e dicas de William Douglas sobre "Como Passar" em concursos públicos: